Hoje eu vi alguém preparando bolinhos de chuva e isso trouxe uma enxurrada de memórias que eu nem deveria ter. Alguns de vocês têm alguma lembrança da infância de quando tinham 2 ou três anos? Pois eu tenho e muita gente fica surpresa com isso. Por este motivo, chamo-as de memórias de infâncias passadas, afinal, poucas pessoas lembram-se desses momentos e eles acabam parecendo algo de outra vida. O engraçado com estes relances do passado é que são como flashes. Detalhes muito específicos de coisas que parecem até imaginadas. Por isso, bolinhos de chuva lembram-me que…
Minha avó materna sempre fazia bolinhos de chuva. Era um hábito e algo só dela! Toda vez que chegava visita em casa, a velhinha ia até a cozinha passar um café e fritar bolinhos de chuva. Parece coisa de brasileiro mesmo, mas foi só influência do tempo que ela morou aqui… Faz eras que eu não como essas iguarias, mas, quando as vejo, jamais deixo de lembrar da senhora japonesa que tanto me assustava quando criança. Eu era muito pequena e ela não falava português… Como eu não a entendia, sentia medo. AH! As crianças e suas manias de conforto. Minha avó me deixava desconfortável por eu não entendê-la. Além de tudo, ela tinha uma pinta no rosto que me deixava ainda mais desconfiada. Bobagem. Eu também tinha uma pinta, embora não tão vistosa.
Ela morreu quando eu tinha 5 anos. Certo dia, estava lá na chácara onde ela morava e ela foi passar café na cozinha. Caiu no chão antes mesmo de colocar a água no fogo. É assim com derrames cerebrais. Acontece tudo tão rápido que você nem percebe. Acho tão estranho lembrar de um detalhe desses… Eu era tão nova, mas tenho plena certeza de que ela foi fazer café. Depois disso, ela foi internada e… Bem. Este fora o segundo que derrame ela sofrera. Fica difícil suportar as cirurgias e, eventualmente, depois de um tempo, a vida segue seu curso.
Hoje, com vinte quatro anos na cara, fico imaginando o curso de vida dela. Imagina só, ela viveu a Segunda Guerra mundial lá no Japão! Com filhos e tudo o mais. A família veio para Brasília à convite do JK, para compor o cinturão verde ali na Vargem Bonita. Viveu uma outra era… Cresceu para ser esposa e meu avó morreu muito antes de eu nascer. Ela ficou tão perdida no mundo… Fico imaginando como funcionavam as lembranças dela e o que ela teria pra me contar. Será que ela também teria memórias de infâncias passadas, assim como eu? Impossível dizer.